Estranho e pertubador


Ren & Stimpy é sem dúvida a animação mais estranha e, por muitas vezes, perturbadora da televisão. A série é exibida no Brasil pelo canal a cabo Nickelodeon nas madrugadas dos finais de semana. Os dois protagonistas são Ren, um cão chihuaua sem pelos, e seu amigo Stimpy, um gato vermelho de nariz azul, criação do cartunista canadense John Kricfalusi.

Segundo o dicionário Aurélio, estranho, como adjetivo, é aquilo que é fora do comum; desusado, novo; anormal, ou ainda, misterioso; desconhecido ou enigmático. E é assim mesmo que esta animação parece ser.

A primeira característica que chama atenção é o traço de estilização visual, que lembra as animações dos anos 1950 e 1960. Esta opção de estilo não assume o aspecto de simples citação ao passado ou paródia. Vai além. É a adoção mesmo de um estilo de desenho que não está mais em voga. Por este aspecto, ao assistirmos a animação, temos a impressão de estarmos vendo algo que vem do passado. Algo que é novo mas não pertence ao nosso tempo, assim como ver um fantasma. É esse conflito temporal que causa um primeiro estranhamento.

O segundo aspecto, e aí entra o componente perturbador, são as estruturas das histórias e o compotramento de seus personagens. Em algumas episódios, os personagens (ou Ren, de modo mais frequente) se envolvem em situações de isolamento e de perda de contato com o mundo exterior.

Não tenho aqui nomes de episódios ou temporada para citar, mas me recordo que em um dado episódio, os dois protagonistas pegam uma carona em um automóvel. Daí em diante tornam-se reféns de seu proprietário, um sujeito com ares de gangster. O automóvel em questão, semelhante a uma limosine, era conduzida por um motorista e seu dono ia no compartimento posterior, onde os dois bancos de passageiros eram virados um de frente para o outro. Do momento que entram no automóvel em diante, não será mais possível desembarcar, assim como não lhes é dada nenhuma explicação do porquê. Seu anfitrião pouco lhes diz e o veículo não para, a não ser para recolher outro desafortunado caronista. A situação não leva a lugar nenhum e como todas as demais histórias, não há desfecho conclusivo ou outro elemento que de um sentido à história.

Em outro episódio, Ren e Stimpy ficam presos em uma cabana coberta de neve. Daí em diante passam a sofrer alucinações e delírios causados pela fome. O estranho é que, pelo que a história dá a entender, os dois são os únicos que creem que estejam mesmo numa cabana coberta de neve, realidade essa não compartilhada por outros personagens que surgem no desenrolar do episódio. No desfecho,  o monte de neve que cobre a cabana é mostrado em meio uma paisagem de ensolarada, inclusive com uma piscina onde alguns personagens se banham. Seria esse isolamento puramente psíquico e não real?

O isolamento, a perda de contato com a realidade, a percepção alterada do tempo, alucinações, insonia, pensamentos paranóicos e obsessivos são comuns nos episódios e, como já dito, mais frequente ao personagem Ren que aparenta ter uma personalidade psicótica. Por sua vez, Stimpy tem um comportamento marcado pela ingenuidade e por ser pouco inteligente, embora raramente demonstre inteligência ou tente reconectar Ren à realidade. Por outro lado, Stimpy frequentemente é alvo de tentativas de assassinato por parte de Ren, durante surtos e alucinações que este sofre.

Para finalizar esta breve lista de estranhamentos e bizarrices, outro tema recorrente é a escatologia, com situações que envolvem secreções corporais, sebos e catarros. Embora a escatologia seja frequente em animações voltadas para publico infantil, em Ren & Stimpy o tema assume um tom bem nojento e perturbador.

Sem dúvida, esse não é um desenho para ser assistido pelas crianças.

Nenhum comentário: